sexta-feira, 20 de abril de 2012

old paper


estou ficando velha e amarela como os papéis do meu passado. numa contagem regressiva até a década do meu nascimento tudo é amarelo, velho e puído por traças. minha certidão de nascimento é assim, as imagens dos takes dos jogos de futebol do meu tempo, as fotos de bebê e até as roupas da infância que me restaram. o elo entre aquele amor e a vitalidade soberana até os 25 agora faz contagem reversa,conspira contra, é volátil. sou mais velha que a minha tia que nasceu em 1957, já que morreu aos 18. sou mais velha que a minha mãe quando me concebeu. sou mais velha que o meu pai quando casou. sou mais velha que alguns amigos que nasceram antes de mim e que já não existem mais. sou mais velha que hendrix, joplin e morrison. não acredito em contos, já não aumento pontos. a idade traz coisas que não se pode esconder. a velhice fundamenta, grifa em vermelho, mostra as marcas na cara e é maior que a juventude. é soberana e irreversível.

terça-feira, 17 de abril de 2012

remember

minha boca sorri porque há articulação suficiente para isso. por conta de meus braços serem ligados a membros superiores e terem terminações táteis eles não são pernas. só choro quando glândulas lacrimejantes permitem a saída da emoção que não quer se calar. se eu falasse pelos poros falaria muito mais que falo hoje. se mastigasse com o cérebro não comeria, estaria apenas pensando. se amasse com os olhos apenas exergaria. se tivesse outra cara, seria outra pessoa. se nascesse em outros campos, talvez não estivesse aqui.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

comedeiras

meus membros antropofágicos só querem comer. quero comer com as mãos, com os pés, com o cérebro, com os olhos. venha, me dê de comer. quero me orgulhar do que as minhas entranhas recebem, quero transpor o que o meu sexo não dá conta. quero passar do ponto, ir além do limite. quero ter a extravagância do extrapolar. quero o não caber, o não ter tamanho, a boca cheia, a cara suja, a mão grande. quero os contornos, os volumes, as formas não formais. o que não basta. o copo até a boca , a mesa cheia, a cama farta e todas as comilanças do poder de comer. entradas lotadas até explodir na loucura da falta de fome e da sobra da gula.